CONCEPÇÃO DE INFÂNCIA
O
caráter histórico do fenômeno da
infância inclui a superação de uma concepção de mundo fundamentada no
pressuposto estático, linear e harmônico de que a criança é sempre a mesma em
qualquer tempo e espaço.
Trabalhar
a concepção de infância em uma perspectiva histórica demanda compreendê-la como
fruto das relações sociais de produção que engendram as diversas formas de ver a criança e produzem a
consciência da particularidade infantil. Neste sentido, a concepção de infância
varia de acordo com a cultura onde ela é concebida.
A
partir do século XVI, ao contrário do que valia para a civilização medieval,
começa a se estabelecer a diferença
entre o mundo das crianças e o mundo dos
adultos. No século XVII, mudanças consideráveis vêm contribuir de forma
definitiva e imperativa para a concepção de infância atual. Definiu-se um novo lugar para a criança e para a
família, fruto das novas relações sociais que se estabeleciam pela então
sociedade capitalista.
É
no contexto da sociedade burguesa que o homem é destituído de seus instrumentos
de produção, passando a ter como forma de sobrevivência apenas a sua força de
trabalho. A organização desse processo
exigiu aumento de produção, incluindo a atuação da mulher e da criança
no mercado de trabalho, essencialmente na fábrica.
Novas
necessidades são estabelecidas para a família da classe trabalhadora, quanto à
tutela das crianças ainda não envolvidas
com o trabalho. Dificuldade que será resolvida por instituições já existentes
desde a Idade Média, conhecidas por asilos, caracterizadas por esta função de
guarda e voltadas para suprir as necessidades básicas das crianças órfãs,
abandonadas, pobres, das quais passam a fazer parte, também, os filhos das
famílias trabalhadoras.
Ao
mesmo tempo em que a criança da família
trabalhadora é envolvida na produção econômica, filósofos e educadores
do final da Idade Média e início da Idade Moderna trazem novas contribuições ao
que naquele momento se compreendia por infância. Estes estudiosos fundamentaram-se nas
características da “natureza infantil”,
que atribuía à criança aspectos de dualidade, ou seja, se por um lado a criança
era dotada de capacidades inatas, de
potencialidades naturais, de outro era ser
incompleto e imaturo: precisaria
ser modelado, ensinado e educado.
Em
função disto, a criança deixa de conviver com os adultos e passa a ser mantida
à distância, separada deles, num processo de enclausuramento denominado escola.
Tal fato vai caracterizar fortemente o século XVIII, evidenciando, desta forma,
a existência de um mundo próprio e autônomo da infância.
Desta
maneira, as instituições que faziam a guarda das crianças em asilos passam a
receber a influência desse pensamento
educacional. A educação das crianças pobres, órfãs e filhos de
trabalhadores começa a adotar os
princípios de corrigir, compensar e recuperar sua condição de marginalidade
social.
Em
meados do século XIX a educação compensatória é considerada como solução para a
privação cultural. Kramer (1992) assinala que este pensamento tem origem nas
contribuições de Pestalozzi e Froebel, e num momento posterior é complementado
por Montessori e McMillan, entre outros. A educação era vista como modo de
superação da condição social de carência
e deficiência, o que posteriormente veio
caracterizar as propostas pedagógicas para a pré-escola.
Segundo
Kramer ( 1992, p. 19) “ A ideia de infância, como se pode concluir, não existiu sempre, e nem da mesma maneira.”
O
conceito de infância foi construído a partir das relações sociais estabelecidas
e não em função de uma essência ou natureza da criança. Porém, tanto o
pensamento pedagógico de caráter tradicional quanto o da Pedagogia Nova
desvinculam a ideia de infância dos fatores econômicos e sociais, concebendo a educação como um
fenômeno metafísico, respaldada pela teoria evolucionista. No Brasil, o processo de desenvolvimento e
urbanização vivido desde o final do século XIX caracterizou-se pela crescente
industrialização, favorecendo a reprodução das condições sociais de miséria e
pobreza. As propostas que vão ter importância
nas políticas educacionais adotadas fundamentaram-se em programas de
educação compensatória, baseados na teoria da privação cultural. As dificuldades de aprendizagem são localizadas
na criança ou em sua família encobrindo, mascarando e desconsiderando as
diferenças sociais.
Segundo
Kuhlmann Junior (1991), a história das instituições pré-escolares, creches,
asilos e jardins de infância no Brasil não ocorreram apenas como uma sucessão
de fatos em diferentes tempos: constituíram-se
tendo como influência os diferentes
momentos históricos vividos no país e a concepção assistencialista da
infância, traduzida em propostas de educação.
As
creches e os asilos eram mantidos através
do serviço de filantropia: senhoras da sociedade acolhiam as crianças
para as mães poderem trabalhar. Também a igreja dá a sua contribuição neste
período. Recebia as crianças e realizava uma ação de doutrina de acordo com
seus interesses evangélicos, para que não ficassem abandonadas pelas ruas. A
criança pobre era considerada um problema que deveria ser resolvido; em função
disso, foram definidos parâmetros na legislação trabalhista, visando a um
atendimento institucional.
As
instituições pré-escolares assistencialistas seguiam a proposta educacional que
vinha ao encontro das diretrizes da assistência científica (praticada nas
creches e asilos) e na qual o Estado não tinha nenhuma obrigação, mas assumia a
função de supervisionar e subsidiar as entidades
tendo também como finalidade a submissão das famílias e das crianças das
classes populares. A educação, nesta perspectiva, tinha uma prática intencional
que visava ao atendimento da criança para sua adaptação na sociedade: era-lhe
permitido desenvolver suas aptidões e ela era conduzida à entrada no ensino
formal e à escolha de um ofício.
Nesta
mesma época, voltada para o atendimento das elites, no setor privado,
desenvolveu-se a educação pré-escolar no Rio de Janeiro. E jardim de infância em São Paulo, em escola pública para
atender esta clientela.
Com
a Constituição Federal de l 988 e que se
estabeleceu um caráter diferenciado para a compreensão da infância, impondo-lhe
uma dimensão de cidadania. A educação da criança de 0 a 6 anos, seja em creches ou pré- escolas, está vinculada
necessariamente ao atendimento do
cidadão-criança; a criança passa ser entendida como sujeito de direitos e em
pleno desenvolvimento desde seu nascimento.
Neste
sentido, o trabalho a ser realizado nas instituições de educação infantil
vincula-se às peculiaridades do
desenvolvimento humano específico desta faixa etária, na perspectiva de
garantir os direitos fundamentais da criança, ou seja, direito à educação, saúde e assistência, para uma
parcela da população que historicamente foi negligenciada.
PROPOSTA CURRICULAR DE SANTA CATARINA- EDUCAÇÃO INFANTIL
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